Carta Aberta do Mano Mané Garrincha para o "Seu" presidente Obama


“Eles não querem só a minha morte. Querem o meu silêncio.” - Mumia Abu-Jamal*.

De: MANÉ GARRINCHA
Para: “SEU” PRESIDENTE OBAMA


Seu Obama,


Meu nome é Mané Garrincha. Joguei muito futebol, aquele esporte ao qual vocês estranhamente chamam de soccer, e nós, sem estranheza nenhuma. às vezes chamamos também de chutebola.

Seu país já teve grandes atletas. O nosso também.
Quero falar de esporte mais antigo e não muito praticado no mundo: liberdade.


Na história do esporte liberdade, vocês contam com Jefferson e Ben Franklin, verdadeiros pára-raios, mesmo em tempo chuvoso, e o maestro Walt Whitman – elegante cantador da fraternidade. Depois, vocês tiveram o melódico Bob Dylan, o centroavante Luther King, o ponta-esquerda Malcom-X e o sábio Noam Chomsky, capaz de driblar e fazer gol de letra com toda palavra certa. Falo só de alguns, seu Presidente. Do nosso lado de cá, podemos falar de Herzog, que saiu do jogo asfixiado por uma gravata aplicada por jogador da extrema direita do time oposto; tivemos também jogando na esquerda o mano Marighela, traiçoeiramente eliminado antes da metade do jogo; Osvaldão do Araguaia, que também foi tirado de campo injustamente. Em tempos passados, lembramos os polivalentes Zumbi dos Palmares e Gangazumba, do heróico time Quilombola; Frei Caneca, fuzilado por traiçoeiro tiro da zaga contrária; Abreu e Lima, que, ao lado de Bolívar, pelejou na brilhante seleção da América do Sul; o caboclo Conselheiro, que jogava – e muito bem – em estádios sem grama. Dos brasileiros vivos nada falo. Alguns são muito vivos. Outros morrem ou estão esperando a morte chegar.


É claro, seu Presidente, que tanto a nossa turma quanto a sua já tiveram jogadores de pouca valia, verdadeiros assassinos em campo e no campo e nas cidades. Vocês tiveram William Linchy, que, na língua que falamos na nossa banda subequatorialmente abaixada do mundo, resultou no verbo “linchar” (matar sumariamente, sem julgamento); vocês também tiveram cartolas em seu time que ordenaram matar índios e negros, invadir países vizinhos ou distantes, detonar bombas atômicas, perseguir, prender e matar todos aqueles que fossem considerados inimigos. Em tempos recentes, vocês tiveram Nixon, Reagan, Bush I e Bush II, que jamais jogariam ou seriam da comissão técnica de qualquer time decente. Você, seu Presidente, assumiu o comando de seu time, mas ainda continua o jogo sujo lá nas arenas e morros do Oriente. Por quê?


Nós também tivemos predadores da mesma espécie: o brutamontes Jorge Velho, que escravizou índios e foi contratado para matar negros; os imperadores Pedro I (vulgo Pedro Pontapé) e seu filho Pedro II (vulgo Pedro Banana); os milicos da República: Deodoro da Fonseca (perna fina e bunda seca), Fuloriano Peixoto (que não valia fulô e nem biscouto), Castelo Branco (que não tinha cabeça nem pescoço), Costa e Silva (que quando morreu deu sorte a quem apostou no burro); Médici (cuja inteligência era limitada, mas cuja estupidez até hoje mede-se); Geisel (o pastor alemão); Figueiredo (que não serviu nem como brinquedo). Todos eles genéricos generais, exceto alguns marechais.


Seu Presidente, queremos criar nosso time, que já se chama Liberdade. Existe um atleta, em (campo de) concentração no seu gramado. Ele poderá compor nossa equipe. Requeiro, seu Presidente, em nome dos jogadores da Liberdade, a imediata liberação do atleta MUMIA ABU JAMAL, da gloriosa equipe Panteras Negras, seção Filadélfia. Ele jogará conosco.


Com um abraço, um drible e um passe do Mano.
Mané Garrincha
(não conhecido como Manoel Francisco dos Santos)



*Jornalista e radialista estadunidense, fundador da organização Panteras negras, seção Filadélfia nos anos sessenta, conhecido como “a voz dos sem vozes”, Mumia Abu – Jamal, acusado de matar um policial branco no ano de 1982, ainda que nada tenha sido comprovado, segue encarcerado no corredor da morte daquele país. Seus acusadores, pelo contrário, compõem um quebra-cabeças macabro: o juiz que o sentenciou a morte mantém relações estreitas com a organização racista paramilitar Klu Klux Klan, sendo o juiz que mais enviou presos negros a morte no estado da Pensilvânia, mesmo estado onde ABU – Jamal encontra-se preso. Uma das testemunhas, que disse no julgamento ter visto Jamal disparando sua arma contra o policial, arrependeu-se posteriormente, mas isso não implicou em novo julgamento. Para piorar sua situação o projétil do crime de uma 44 desapareceu e o mais bizarro é o fato de Mumia Abu – Jamal, na época, portar um revolver 38. Estamos diante de um belo exemplo de como funciona a democracia no centro capitalista, os Estados Unidos da América.
     
                        
PANTERAS NEGRAS

4 comentários:

  1. Triste ver o Mumia nessa situação. Uma penitencia para um homem, um retrocesso para a humanidade.

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  2. Olá! Muito bacana o blog de vcs!! Gostaria de saber onde se localiza o Espaço Cultural.
    Conheci o blog por uma indicação de um amigo de vcs, o Andres. Ele comentou num post meu sobre Drummond, q alias, sensacional esse post do Drummond!!! Adorei!
    beijinhos

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  3. O Espaço Cultural está localizado no seguinte endereço: Rua Silveira Martins, n° 131, sala 11. Metrô Sé. Saída do Poupa Tempo. Em breve, publicaremos as próximas atividades do Espaço neste blog.

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  4. Tanta expectativa em cima do Obama e nada realmente significativo mudou. As pessoas ainda não entenderam que não é a política partidária que vai mudar nada. Nunca foi e nunca vai ser. A política que realmente importa só o povo pode fazer. Nas ruas e no cotidiano. Todo poder ao povo.

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