Sítio São Francisco: Quadro de Vidas


Casas são demolidas. Prédios são construídos. Estas são partes da imagem de um quadro que os governos do Estado de São Paulo e da prefeitura da Cidade de Guarulhos vêm pintando. Um quadro de duas cores que em nada se distinguem, apenas oscila entre as molduras. De um lado, apresenta-se a figura de um governo - quase que perpétuo no Estado - que se move hoje sob a corda bamba de uma vitória eleitoral incerta. Do outro lado, no entanto, sem muita distância do anterior, apresenta-se com uma falsa roupagem de trabalhador, a base da submissão ao capital. Geraldo Alckmin (PSDB) e Sebastião Almeida (PT) caminham, com alguns obstáculos, pelas veredas que as grandes empreiteiras vêm construindo na cidade de Guarulhos. Ambos caminham de mãos dadas na direção única da satisfação empresarial.

O Sitio São Francisco fica localizado em uma região entre as rodovias Ayrton Senna e Presidente Dutra, uma área de forte interesse do setor imobiliário; o bairro periférico da Cidade de Guarulhos, há décadas, local de morada de famílias trabalhadoras que construíram suas casas para, sobretudo, acomodar a chegada das próprias labutas diárias nascidas da exploração do trabalho, têm sido alvo destes pintores de paredes¹. Um, com os seus pinceis materializados em marretas, traz aos olhos dos moradores o tom cinza do concreto despedaçado ao chão. O outro, pinta, a tratoradas, o sangue de vidas que se submeteram há anos de exploração para construir um pedaço de teto onde poderiam viver.

Os moradores do Sítio estão sendo obrigados a deixarem suas histórias soterradas nos escombros; e, as, ‘generosas’, Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) e a Secretaria de Habitação da Cidade de Guarulhos lhes oferecem em contra partida uma dívida de mais de duas décadas e um prédio que muita das vezes não acomoda o número de pessoas e animais domésticos.

Estas medidas impositivas do capital têm gerado desconfortos psicológicos nos que diretamente estão sendo afetados, os casos são muitos. Em detrimento destas ações é a construtora a que mais se beneficia com esta parceria entre a verba pública, o lucro privado e as lágrimas de quem trabalha.   
 
Frente às marretadas, às tratoradas, aos lucros, os moradores do Sítio São Francisco têm se organizado na tentativa de por fim a este cenário de destruição de suas vidas, trazendo à tona as ferramentas de luta que lhes são necessárias. Em manifestações de rua pelo centro de São Paulo e de Guarulhos, gritam: “Da minha casa não saio não! Quero lazer. Saúde. Educação”. 

A arte tem sido outra ferramenta que os moradores se utilizam como mais uma das maneiras de resistir a esta lógica predatória do lucro e dos conchavos. Foram realizados alguns saraus em que essas questões foram o centro das expressões artísticas, deste modo, aqueles que lutam pela permanência de suas casas e melhores condições de vida, são os obstáculos combatentes que trazem em suas manifestações e arte as verdadeiras cores ao quadro de suas vidas.     

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¹ pintor de paredes - expressão ‘carinhosa’ que Bertolt Brecht usou ao se referir ao Adolf Hitler 





Obs.: O texto e a charge desta postagem foram publicados na última edição do Jornal Aroeira.

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