Nazionismo: a verdadeira política de Israel



Houve um tempo em que o povo judeu foi perseguido, roubado e exterminado. Foi assim por milhares anos. O auge dessa opressão se deu sob o regime nazista, quando aproximadamente 6 milhões de judeus foram mortos em campos de concentração. A propaganda nazista, com seu ideal estético higienista, pretendia que o povo judeu fosse considerado uma espécie de sujeira, origem de toda a contaminação e degeneração dos povos racialmente “superiores”. Não é possível criar uma consciência fortemente nacionalista, sem eleger um inimigo. O judeu tornou-se o inimigo do povo alemão, como um rato é inimigo na higiene pública. A consequência direta desse raciocínio foi o extermínio sistemático do povo judeu. Foi o que os nazistas fizeram. Providos de um forte aparato técnico e tecnológico, segregaram aquele povo em guetos, num primeiro momento, e o confinaram em campos de concentração, em um segundo momento, para, enfim, “dedetizá-lo”, como se faz com os ratos. Neste caso, o uso de câmaras de gás não se deu ao acaso: tratava-se de um elemento correspondente à ideia de higienização, presente no ideal estético do nazismo.

O movimento sionista, que fundamentalmente defendeu o retorno do povo de Moisés à “terra prometida”, com a criação de um Estado judaico, nasceu desse histórico. Em 1947, após os anos do holocausto, o Estado de Israel passa a existir. Porém, sua existência teve e tem de pagar um alto preço à moral da história: em alguma medida, o Estado do povo judeu edificou-se como um simulacro do nazismo - coisa no mínimo irônica, se levarmos em conta que a criação de Israel justificou-se em parte pela perseguição nazista aos judeus.   

Isso significa que esse Estado forjou sua identidade nacional e sua estrutura política elegendo um inimigo e o tratando como a origem de todo o mal: este inimigo é o povo palestino, e a consequência direta dessa hostilidade é seu extermínio, sua higienização. É neste sentido que Israel tornou-se um arremedo no nazismo. Ao passar sua vassoura por sobre Gaza, Israel nos faz remeter à performance da Alemanha nazista em Varsóvia e em tantos outros guetos judaicos. Como disse Marx, “a história se repete, a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa” (“Dezoito Brumário de Luis Bonaparte”).

Israel não faz a pompa do 3º Reich. Não tem um líder histérico, uma máquina de propaganda gigantesca, um exército de 1,5 milhões de soldados, não promove desfiles militares diários, com estandartes, plumas e paetês, não se esforça em demonstrar sua supremacia racial, não berra ao microfine, não baba de ódio, não usa nenhum bigodinho dos cantões. Ao contrário, suas indumentárias têm o sofisticado corte da democracia liberal. Israel é discreto em sua cólera. Assim mesmo, se iguala ao nazismo, na medida em que se sustenta na promoção do extermínio sistemático de um povo indefeso.

Sim, indefeso. O que está acorrendo neste momento não pode ser considerado uma guerra. Quem considera o mais recente conflito entre Israel e a Palestina uma guerra é tão criminoso quanto Israel. Que saibam todos, à luz de uma verdade que não se vê na grande mídia: o que está acontecendo é um massacre, uma carnificina, um genocídio. O que está acontecendo é comparável ao holocausto, ou ao massacre armênio de 1915.

As forças armadas mais bem equipadas do mundo estão bombardeando noite e dia e com a toda a força um território civil. No momento em que escrevemos este texto, o número de palestinos mortos chega a quase 200, dos quais 70% são civis, incluindo crianças. Impossível crer que as forças militares mais bem preparadas do mundo possam acumular 70% de erro. Não pode ser erro! Israel está aniquilando famílias inteiras, que não representam nenhum tipo de ameaça. Os foguetes lançados pelo Hamas ao território judeu, de baixa precisão, comumente abatidos pelas baterias antiaéreas israelenses, não podem justificar tamanha barbárie. Aliás, verdade seja dita, o Hamas está apenas respondendo à violência de Israel.

Tudo isso (re)começou com o sequestro e morte de três adolescentes israelenses. As suspeitas recaíram sobre a militância palestina. Com isso, parte da população de Israel foi às ruas, pedir retaliações aos supostos culpados. Era o pretexto que Benjamin Netanyahu precisava para atacar. Desde o anúncio da aliança entre o Hamas e o Fatah, o primeiro ministro israelense tenta encontrar um motivo para o conflito. Tal aliança aumenta as perspectivas de um Estado palestino - e um Estado palestino, soberano, com prerrogativas garantidas pelo direito internacional, é tudo que Israel menos quer. Por isso atacou. Os bombardeios sobre a Faixa de Gaza - o gueto do povo palestino - acontecem menos por retaliação do que pela chance de enfraquecer a aliança Hamas-Fatah. Neste sentido, a defesa palestina é totalmente legitima, ainda que de modo algum possa fazer frente ao aparato militar israelense.          

O que é mais dramático nesse quadro, onde famílias inteiras têm suas vidas arrasadas, é que não há perspectivas de superação – pelo menos, a curto e médio prazo. Por conta do poder econômico judaico e do subjacente movimento sionista, o qual ainda domina boa parte do capital financeiro mundial, penetrando corredores palacianos e influenciando os mais importantes gabinetes de governo, a comunidade internacional lava suas mãos diante dos crimes de Israel. Além disso, a aliança entre este país e os Estados Unidos, em torno do controle político do Oriente Médio (maior produtor de petróleo do mundo), dificulta qualquer avanço no sentido da criação de um Estado palestino, única força capaz de conter a brutalidade israelense. De fato, Israel funciona como um posto avançado do imperialismo estadunidense na região, e, sendo assim, tem carta branca dos EUA e da ONU para cometer qualquer tipo de violação que lhe for conveniente.

Tal realidade, a condescendência de outros países em relação à violência de Israel, também faz lembrar o nazismo, no que se refere à impunidade. Durante muitos anos – menos tempo que Israel, porém tempo suficiente para promover o maior massacre da história – o governo hitlerista se viu livre de qualquer constrangimento por parte da comunidade internacional. Todos sabiam do genocídio que vinha ocorrendo na Alemanha, mas nenhum país se levantou para denunciá-lo. Somente a guerra botou fim ao massacre dos judeus. Hitler caiu e alguns membros do alto escalão do seu governo foram julgados em Nuremberg.

Desses fatos surge inevitavelmente uma pergunta – pessimista, em si: teria o extermínio dos judeus cessado se não houvesse uma grande guerra? Tendemos a pensar que não, o que torna a resposta mais fatal que a pergunta. Obviamente, o nazismo deve ser compreendido em sua totalidade, o que faz a guerra expansionista e os campos de concentração promovidos pela Alemanha nazista dois lados de uma mesma moeda. Todavia, o que se extrai dessa pergunta é a possibilidade de que, sem uma grande ruptura, um processo como o genocídio promovido pelo Estado pode atingir plenamente seu objetivo, que nada mais é que exterminar o povo eleito inimigo.

Dificilmente Israel irá conseguir varrer do mapa o povo palestino. Este povo é bravo e sempre irá resistir à covardia de que é vítima. Porém, o extermínio de um povo não é apenas físico. Israel não quer varrer do mapa cada palestino. Sequer pretende que a Palestina deixe de existir de forma literal. Israel precisa da Palestina, na medida em que toda sua estrutura política, ideológica e militar é constituída e justificada em oposição a ela. O que Israel pretende promover é um extermínio político-cultural. Quer matar o povo palestino naquilo que o torna palestino. Fazê-lo perder-se de si mesmo. Quer minar suas forças vitais. Torná-lo doente da cabeça aos pés. Usa das armas para tanto, promovendo grandes massacres de tempos em tempos, e mantendo sob seu controle a Faixa de Gaza e a Cisjordânia. 


Seria agradável aos olhos ver Netanyahu e outros dirigentes israelenses sentados no banco dos réus, respondendo pelos crimes que cometem contra a humanidade. Quem nos dera ver o sionismo, com seu Estado, sua política, e sua estética protonazista, ruir terra a baixo. Porém não há em vista nenhuma grande ruptura capaz de frear a marcha de destruição de Israel. O que fica é nosso desejo de uma verdadeira justiça, a qual não pode ser realizada senão pela mão dos oprimidos, e nossa solidariedade ao grande povo da palestina. 

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